Um belo exemplo de arrogância e estupidez é a imagem de um
leigo dando palpites técnicos para um profissional. Como professor de português,
de escola pública, ouço o tempo todo pais e não pais bancando os catedráticos sobre
o modo de ensinar os alunos. Os anos passados na faculdade não contam mais do
que o achismo cheio de lugares comuns e equívocos sobre o que deve ser a
educação ideal. A escola também pode ser a selva do empirismo sem critério.
Só existe uma classe de profissionais que sofre mais com os
palpites do que professores: a dos futebolistas, técnicos e jogadores. Na pátria
de chuteiras e sem bibliotecas, todos nós jogamos ao menos meia dúzia de
peladas, assistimos a jogos desde o útero e prestamos muita atenção ao que é
dito nas mesas redondas, por “profissionais gabaritados”; tudo isso somado deve
nos colocar no mesmo nível de Telês, Saldanhas, Bielsas e Guardiolas.
Não tenho a menor pretensão de dizer o que é certo a um
grupo vencedor e de alto nível de profissionais que é o time do Santos,
comissão técnica inclusive. Sou um mero torcedor que passou mais tempo lendo as
crônicas do Luis Fernando Verissimo do que jogando futebol. Não posso dar
palpites sobre esquema tático, substituições e coisas do tipo sem virar um
palpiteiro, ou um torcedor apaixonado.
Mas sou um torcedor. Vi algumas partidas antológicas do Santos,
sei da nobreza que este time ostenta, da constelação de estrelas que sua
galeria de craques abriga. E sei o que é um time sem raça.
O jogo contra o Corinthians pela Libertadores foi triste. Faltavam
ao Santos concentração (quantas bolas fáceis não foram dominadas), marcação
mais convincente no meio de campo (o time marca muito atrás e perde muitas
bolas no meio, não é de hoje), um lateral-direito (Henrique não se adapta
naquela parte do campo, é volante; perguntem onde eles estava no momento do golaço
do Emerson?) e faltou vontade de vencer.
Havia no Santos, fora todos os vacilos, fora toda marcação
competente do adversário, uma falta de gana que tirou desde o momento do gol
toda esperança do torcedor do time da Vila. O time não aprendeu muita coisa com
o Barcelona: ficar tocando a bola sem vontade no campo de defesa, de um lado
para o outro, não é posse de bola sadia: é falta de interesse no jogo. Infelizmente,
e digo isso com pesar, o alvinegro praiano agia de um modo semelhante à seleção
brasileira no horrendo jogo contra a França na Copa de 2006: achava que o gol
sairia a qualquer momento, afinal de contas, naquele grupo havia craque pra
todo lado.
Isso era o que parecia ao torcedor, pode ser que não seja a
verdade. Mas uma boa verdade é que o Velez aprendeu a marcar o Neymar e outros
times já copiam a fórmula, que na verdade é bastante simples e manjada: limitar
o espaço para o atacante carregar a bola. Sendo assim, não adianta o jovem
craque querer partir pra cima dos marcadores a todo momento, achando que
conseguirá fazer grande coisa, que é indestrutível: é preciso tocar e trabalhar
a bola, envolver o time adversário, forçar o erro, driblar no momento certo,
com segurança, com outros companheiros por perto para que a segunda bola seja
nossa.
Falo obviedade e certamente há muita bobagem tática em
minhas palavras. Mas estou certo de que a falta de atitude e de um
lateral-direito de verdade não são fatos vistos apenas por profissionais do
futebol. Cada pé santista precisa entrar firme nas divididas, o time precisa
correr com disposição, não pode desistir, não pode ficar esperando o adversário
deixar jogar. Em semifinal de Libertadores, o tempo das goleadas é passado.
Jogar no Santos é um privilégio. Disputar a vaga para a
final da Libertadores contra o nosso maior adversário, que nunca venceu este
campeonato, é coisa muito séria. Nesse caso, um fracasso, não porque o outro
time jogou melhor, mas por causa do salto alto, da empáfia, da indiferença, do
desinteresse genuíno pelo jogo, pode manchar as conquistas que este grupo já
alcançou.
E, se for para perder, que seja do jeito correto. Não aprendemos
a lidar bem com a derrota apenas quando reconhecemos a superioridade do
adversário, mas quando damos trabalho ao oponente, quando colocamos nosso
desejo, nossa vontade diante dos nossos olhos, ou, no caso, das chuteiras, e
vamos com toda força que a situação nos cobra. Com lealdade, com dignidade, mas
com os olhos brilhando só de imaginar mais uma vitória. Só sabe perder quem
luta até o final pela vitória.
Nós, os torcedores, merecemos essa entrega, merecemos
seriedade tática, merecemos vontade de vencer. A mim chamou a atenção o fato de
ver muitos torcedores envergando camisas do Santos no dia seguinte ao jogo. Havia
mais corintianos que santistas orgulhosos pelas ruas de São Paulo. E o time, na
bola, jogador por jogador, consegue, não sem esforço, mas consegue, fazer dois
ou três golzinhos no Corinthians. Todos nós, inclusive o alvinegro paulista,
sabemos disso – o problema, é que eles não temem mais o Glorioso Alvinegro
praiano.
Um pedido aos jogadores do meu time: levem a sério o canto
que vem das arquibancadas: “Vai pra cima deles Santos!/Vai com determinação/Tu,
que és o glorioso!”
Tu que és o glorioso, Santos.
2 comentários:
Ótimo texto. Como santista, tive quase a mesma visão do jogo e da apatia do Santos, embora tenha sido menos cordial, nas palavras, do que este post do Balaio, pois achei um absurdo a postura do time, pela qual Muricy Ramalho tem muita responsabilidade também...
http://fatosetc.blogspot.com.br/2012/06/corinthians-de-tite-da-um-banho-no.html
Saudações alvinegras... praianas
com relação á apatia, o técnico é o principal responsável. ele tem sido apático há algum tempo, mas tem crédito; só espero que o Muricy não queime todo esse crédito na próxima quarta...
Obrigado pela visita!
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