Não escrevi antes sobre este assunto por três motivos: falta
de tempo, não assisti ao jogo com a devia atenção, não queria, no calor do
momento, insultar ninguém; quando somos torcedores, temos uma espécie de
licença para sermos irracionais, deixamos a paixão nos levar, seja nos louros
da vitória, seja na fúria por derrotas humilhantes; tento abrir mão dessa
licença.
Torcedor também não costuma ser grato nas derrotas,
especialmente as sem muito sentido, as decorrentes de flagrante e notória
incompetência. Todos os créditos se perdem quando jogadores, técnicos e
dirigentes pisam feio na bola ao não enxergarem o óbvio.
Tento ser grato à atual diretoria do Santos. Entre 2010 e
2012 tivemos grandes alegrias, intercaladas por alguma preguiça, fruto da
sensação de dever cumprido para o ano. Esse deitar-se esplendidamente sobre as conquistas
do primeiro semestre nos impediu de concorrer a títulos importantes no segundo
semestre; faz tempo que não disputamos com seriedade o campeonato brasileiro,
embora tenhamos três títulos estaduais − cada vez menos prestigiados, embora
não seja justo simplesmente desprezá-los − uma Copa do Brasil, uma Libertadores
e mais aquela mais ou menos Recopa Sul-americana. Não foi pouco.
Em compensação, por razões que ainda não estão exatamente
esclarecidas, fomos protagonistas de um vexame em escala internacional, ao não
vermos a cor da bola na disputa pelo mundial de clubes de 2011. Os jogadores
que lá estiveram defendendo o distintivo do mais nobre dos clubes brasileiros
(fala de torcedor, mas de torcedor consciente!) não agiram como se estivessem defendendo não apenas o próprio
prestígio profissional, mas a honra de um clube conhecido internacionalmente. Montados
sobre uma fama construída em campeonatos nem tão disputados assim,
desmontaram-se diante do adversário em uma atitude esquizofrênica, entre o
deslumbramento e a admiração idólatra pelo adversário.
Não gosto de ser ingrato, coisa que nós torcedores sabemos
fazer tão bem. Mas ao longo desse ano, a mesma diretoria que soube segurar e
contratar jogadores competentes ou craques da estatura de Neymar, fez péssimos
negócios, desprestigiou um técnico indiscutivelmente vencedor − mas que já não
estava a fim de muita coisa, reconheçamos − perderam jogadores competentes,
grana e títulos. Confiando na mística de que o glorioso alvinegro praiano já
contava com pelo menos três gerações de meninos da Vila, a chamada Vila Famosa,
digo a Vila mais famosa do mundo,
marcaram, para lucrar alguma coisa, um amistoso entre um time feito de
improviso, com garotos ainda inexperientes, contra o time mais respeitado e
temido da Terra, time este reforçado com um craque da estatura de Neymar, motivado
e feliz pela sua estreia.
Dessa vez, livres da ilusão coletiva que nos acometeu em
2011, nenhum torcedor do Santos era capaz de acreditar em uma vitória, em um
empate sem gols que fosse. Os mais otimistas, como eu, imaginavam que haveria
um jogo de compadres, cujo resultado ficasse em torno de 3 gols de diferença, e
isso contando com a nobreza do adversário. Os mais pessimistas pensavam em
cinco, seis gols. Levamos oito sem ver a cor da bola.
Não sou um estudioso do futebol, entendo pouco ou nada de
tática, gosto de ver jogadas bonitas, sei diferenciar um volante de um zagueiro
e torço de coração pelo Santos e pelo Brasil, em primeiro lugar, mas raramente
assisto a alguma disputa, de qualquer esporte que seja, sem tomar partido. Até eu,
torcedor leigo que sou, sabia que um jogo entre o time que mais acumulou
títulos nos últimos anos e outro cuja maior parte dos jogadores e a comissão
técnica sequer goza de experiência regional − técnico e boa parte dos jogadores
ainda não disputou partidas contra Corinthians e Palmeiras, por exemplo − não poderia
dar em coisa boa para nós. Quanto dinheiro poderia pagar a humilhação, o
vexame, as piadas feitas até pela seleção do Taiti, que sequer é formada por
profissionais?
Laor e demais dirigentes do Santos, continuo grato pelas
vitórias do passado recente. Mas gostaria de crer que absurdos como estes não
se repetirão mais. Gostaria de crer que vocês não confirmarão a tradição
histórica de que o tempo de validade dos cartolas brasileiros é extremamente
curto, que o competente de hoje é o burro de amanhã, que o moderado e honesto
de agora será guloso e corrupto depois. Não endossaria a opinião de que esta equipe
deve sair imediatamente da diretoria do Santos, mesmo porque minha opinião de
distante torcedor não vale pra muita coisa, mas tenho duvido que o coração de
vocês esteja sangrando mais que o meu.
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