Minha esposa tem um
aluno de 5 anos que é santista. De vez em quando o garoto reclama, querendo
usar a camisa do time do coração em vez da camiseta com o emblema da
prefeitura. Ele deve pensar, não sem razão, que uniforme por uniforme, melhor
usar aquele lembra grandes feitos.
Dou completa razão ao
santista, já que seu time tem Neymar e "um passado e um presente só de
glórias". Já no time da prefeitura paulista há uma galeria de nomes não
apenas controversos, mas indesejados, vergonhosos, que não citamos para não
espantar a pretensa poesia escondida nessa crônica.
Falava do jovenzinho
santista. O mais legal desse apego do garoto ao clube é que ele não herdou o
benefício de torcer para o glorioso praiano do pai, que é são-paulino: a causa
dessa paixão precoce e comovente é o balé com bola de Neymar. É o que basta
para que o ainda jovem jogador tenha seu lugar garantido na história do clube.
O aluno da minha esposa é a prova vivíssima de que o craque, ainda santista, já
pode partir para novos espetáculos em outros gramados, quite com a torcida e
com seu nome gravado no panteão dos craques santista, orgulho que nem todos
podem ter.
Vivemos tempos menos
românticos. Há muito tempo é raríssimo um jogador de futebol no Brasil ficar em
um clube tempo suficiente para formar novos torcedores. Ninguém duvida que Kaká
conseguiu mais torcedores para o Milan do que para o São Paulo. Neymar e Ganso,
mais Robinho, e talvez até Zé Love, arrancaram das hostes adversárias alguns
torcedores que ainda no berço, quase que literalmente, foram tocados pela graça
de um futebol exuberante, ao mesmo tempo eficiente e encantador.
Só Neymar permanece
no clube, e isso faz com que esses garotos mantenham-se fiéis ao Santos. Mas
vivemos outros tempos e, no caso de Neymar, tudo é muito diferente. Se antes
uma transferência podia significar um transbordamento de rancores em todas as
direções − foi assim com Ganso há menos de um ano − com Neymar, creio que,
tirando a parcela dos santistas jovens demais para entenderem esse complexo e
chato lado business do futebol, todos aguardamos, com certa ansiedade, o
momento em que Neymar dirá adeus, ou até logo, ao mítico clube da Vila.
Pensamos no futuro do
jogador, que para firmar-se como craque intergaláctico precisa exibir-se em
gramados europeus. Pensamos nos cofres do clube, que podem ficar recheados com
a venda do atacante − o que nem sempre, quase nunca, é sinônimo de continuarmos
com times fortes. Pensamos, melancólicos, que o momento do clube não é divino,
como foi três, dois anos atrás, e que estar em um time tão limitado como é o
Santos de agora só empobrecerá o talento de um gênio como Neymar, que não
merece ficar engaiolado entre colegas até esforçados, mas sabe como é. Pensamos
que os ciclos de quase tudo na vida, exceto dos mandatos dos cartolas, são cada
vez mais curtos. E, resignados, aguardamos o surgimento de outros craques,
coisa que os novos santistas logo descobrirão que em seu time isso acontece com
mais frequência do que nos times adversários.
Somos gratos, Neymar.
A Libertadores foi ótima, a Copa do Brasil emocionante, os três, quiçá quatro
estaduais deram um up grade significativo. Voltamos a ser notícia boa.
Aparecemos no mundo inteiro. Passamos ligeira vergonha no Japão, a parte triste
presente em todas as trajetórias de grandes heróis. Mas o nosso maior tesouro,
o que ficará pelo menos por mais uma geração, é a manutenção da torcida do
clube, nosso maior patrimônio. Por continuar fazendo história, podemos sonhar
com o futuro.
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