Você
certamente sabe que os professores da rede estadual de São Paulo estão em
greve. Também sabe que a adesão é pequena, apesar de quase a totalidade do
magistério dessa rede estar insatisfeita com seus salários e condições de
trabalho. Você sabe que os salários dos professores da rede pública são
ridículos e que aquela conversa de que um professor pode chegar a receber algo
em torno de R$10 mil reais por mês é uma mentira deslavada. Agora vamos falar
do que você não sabe?
Um
professor da rede pública estadual contratado, da chamada categoria
"O", tem uma série de restrições que passam perto do trabalho
semiescravo. Ele não pode, por exemplo, tirar duas licenças médicas por ano na
mesma especialidade. Digamos que um professor tenha uma tuberculose − meu
irmão, professor de história, está com tuberculose − se recupere e, digamos,
seis meses depois tnha uma recaída, algo bem possível de acontecer: demitido,
sem receber um centavo de multa recisória.
Este
professor "O", que não é funcionário público efetivo, mas uma espécie
de terceirizado, não tm direito a fundo de garantia ou salário desemprego. Jamais.
O Estado sonha com o dia em que terá um contingente de professores suficiente
para que eles se revezem em dois turno, cada um trabalhando durante um ano e
ficando outro ano impedido de trabalhar e, consequentemente, de receber
salário. Este governo tucano já tentou fazer isso outras vezes e só recuou
porque não havua professores suficientes para empreender essa atrocidade
educacional e trabalhista.
Você
deve estar pensando que se fosse obrigado a se sujeita a essas e outras
práticas hediondas do governo, não hesitaria em fzer greve. Mas, meu amigo, se
o cara não pode sequer adoecer, o que você acha que o governo fará com um
professor "O" que fizer greve? Demissão sumária e consequente proibição
de exercer a função na rede até o fina do ano letivo −ou por um período
equivalente ao da vigência completa do contrato, cerca de 200 dias. Na verdade,
essas regras mudam de vez em quando, mas sempre gravitam em torno do absurdo. Daí
que o professor "O", com medo de perder seu subemprego, acaba
evitando a greve.
Um
outro lado podre dessa história é a atuação do sindicato, especificamente a
APEOESP. Para ter uma ideia do modo de ação desse grupo, em 2010, por razões
exclusivamente político-partidárias, a APEOESP propôs uma greve que, caso desse
certo, deixaria desempregados uma série de professores que estavam na sala de
aula. A coisa é mais complexa do que estou relatando agora e adorarei
explicá-la com mais clareza em outra oportunidade, mas o fato é que milhares de
professores, sobretudo novos na rede, boa parte deles ainda não formados mas
nem todos, foram convocdos para uma greve que estava contra eles.
É verdade
que essa situação surreal faz parte de uma armadilha estruturada pelo governo,
Serra e Alckmin revezando-se no terror, mas a APEOESP não é formad por um bando
de professores ingênuos. E foi assim que ela recebeu uma leva de novos e
novíssimos professores na rede estadual: pedindo-lhes que reivindicassem a
própria demissão.
Em
2012, o governo, dando uma banana para uma nova lei que prevê um terço da
jornada de trabalho do professor em atividades sem alunos, com planejamento,
correção de atividades e estudos, deixou tudo como estava. A APEOESP convocou
uma greve quando já não era possível resolver o problema por uma questão de
logística e, mais uma vez, caso os professores lutassem pela mudança fora de
prazo, muitos seriam prejudicados, por acumularem cargos em otras escolas, por
exemplo. Daquela vez, a ta lgreve não pasou de um jogo de cena que sequer foi
encenado.
Em
2011, o governo ofereceu um aumento aos professores que, na prática, após cerca
de três anos, resultaria em um aumento real de algo em torno de R$ 200,00, isso
para os professores de jornada completa. A APEOESP considerou o aumento bom e
sequer tentou negociar algo melhor.
Agora,
em 2013, quando o governo estava simplesmente cumprindo o que havia acordado,
um acordo-chibatada nas costas dos professores, mas devidamente aprovado pela
APEOESP, esta mesma associação "descobriu" que o aumento era insuficiente
e resolveu pedir mais. Também resolveram cobrar do governo que cumprisse a lei
da jornada com um terço sem os alunos. Detalhe relevante: a greve está desde
janeiro marcada para abril, quando não é mais possível rever a questõ da
jornada. Por que a APEOESP não organizaou essa greve para o começo do ano
letivo? A resposta é óbvia: porque não estava interessada de verdade em rever
esta questão. No começo do ano letivo de 2012, quando este assunto fervia, a
APEOESP deu uma de desentndida e foi passear.
Agora
temos essa greve sai não sai, com pouca adesão dos professores, apesar de
insatisfeitos. Alguns motivos da baixa participação: descrença tanto no governo
quanto no sindicato, medo de perder o emprego, não quere compactuar com o
sindicato, especialmente com sua atual presidenta, chamada carinhosamente de "Bebel"
por amigos e desafetos. Esses que não participam, por qualquer razão que seja,
são chamados pelos mais engajados de pelegos, acomodados, tucanos, direitistas.
Aí
apareceu um cartaz de uma professora que estava na manifestação. O texto do
cartaz tinha erros de concordância e de pontuação. No meio de uma manifestação
é comum os textos serem escritos na correria e não passarem por revisão. Mas depois
do calor do momento, divulgar a foto com o cartaz daquele jeito é um erro no
mínimo estratégico. Dirão, e sempre dizem, quando convém, que os professores
não sabem sequer escrever e ainda saem para fazer greve. Comentei em uma rede
social que aquele cartaz deveria ser corrigido. Três professoras
"engjadas" falaram em "várias linguagens", em não haver
erro, em contexto explícito, em USP de direita e contra as cotas, além de
formar maus profissionais, falaram que eu era massa de manora do governo,
reacionário, que eu "também era burro" por escrever sempre com letra
minúscula nas redes sociais, que eu era contra as cotas, de direita e péssimo
profissional, que o professor em geral. Deduziram o diabo a meu respeito. Não importaram
minhas retiradas afirmações de que a greve era legítima: virei o representante
do mal porque ousei comentar o erro de escrita de uma colega.
É o
típico ativismo cego. Só é bom quem concorda com tudo que pistoleiros
ideológios com os dirigentes da APEOESP dizem e fazem. Quem é a favor da greve
precisa concordar com tudo e não questionar nada. Manifestantes assim, que vão
dar mau exemplo nas ruas, entrar em confronto, parar o trânsito e colocar a
opinião pública contra os professores, incapzes de pensar em alternativas aos
piquetes clássicos, servem muito mais à corja tucana do que à própria classe. E
estão escrevendo cada vez pior, usando sempre a incompreendida ideia de que "não
existe certo e errado" quando escrevemos.
Para
a APEOESP, como para Alckmin, o debate é um estorvo. Para seus súditos, a reflexão
é um pecado mortal.
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