quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Verborragia Vazia

Retratinho de uma escritora brasileira contemporânea

Clarah Averbuck. Um nome já desgastado da Literatura Brasileira contemporânea. Não é novidade: tem muito espaço na mídia, e no entanto, ainda não li nenhum livro dela. Assisti a uma entrevista sua no programa Provocações, apresentado por Antônio Abujamra. O pai de Clarah é da dupla Tangos e Tragédias, umas das coisas mais interessantes que há por aí quando o assunto é entretenimento inteligente, além de ser amigo de Abujamra.
Embora ainda não tenha lido os livros da gaúcha, a julgar pela entrevista, não creio que possa esperar alguma coisa que realmente valha a pena. Claro que entrevista não tem, necessariamente, relação direta com as obras que seus autores produzem. Há muita gente por aí que é muito boa de papo e ruim, tão ruim de redação... mas fico temeroso de pagar pra ver, literalmente.
Em primeiro lugar, porque Clarah me pareceu extremamente arrogante. Disse que fazer faculdade é muito ruim, que os professores são muito ruins e castradores, que artista não precisa fazer faculdade, que os críticos são apenas críticos. Depois me pareceu infantil: disse que antes de ser mãe desejava morrer de overdose, algo, na opinião dela, muito glamouroso; que não quer chocar nem inovar, mas que acaba chocando e inovando sem querer. Falava sempre com o mesmo ar de “sou demais, escrevo livros, viajo, conheço pessoas, leio e escrevo coisas interessantes e diferentes e não estou nem aí”.
Clarah, que me pareceu muito magoada com os críticos, cujo trabalho sinceramente desconhece – ao final da entrevista fez um apelo dramático e comovente a eles, pedindo que desligassem a televisão, não comprassem seus livros e não enviassem mensagens para o e-blog dela – reproduzindo um longo e desagradável clichê, ao mesmo tempo que divulgava espontaneamente seu diário eletrônico e público. Foi de chorar.
Tudo bem, nós a compreendemos. Afinal, a crítica literária no Brasil de hoje, fora Manuel da Costa Pinto, está restrita às universidades e aos mestres, como Antonio Candido, que já não critica tanto assim. Parece lógico que quem estude Literatura não entenda e não goste de Literatura, ou talvez não goste de Clarah, não sei bem.
A artista nos informou que não consegue ser organizada, respeitar horários, que não é disciplinada (o que percebemos em seus textos); avisou que escreve para não enlouquecer (já ouviu isso antes?); que não está nem aí para a opinião dos outros (por que não escreve apenas diários então? Mas sem os colocar na internet, por favor); que artista não precisa de faculdade – descobrindo a pólvora, novamente – e, provando que já saiu da adolescência, informou que gostaria de morrer de overdose, mas a filha a demoveu desse nobre ideal. Depois repetiu tudo isso com outras palavras, pela terceira vez.
Se suas entrevistas são sempre tão cheias de clichês, será que seus textos são de alguma forma inovadores? Preciso lê-los. É possível que Clarah tenha um talento para a palavra escrita que não consiga desenvolver enquanto fala. Ou talvez não estivesse em seu dia mais inspirado. O Abujamra inibe as pessoas, especialmente as que não têm muito a dizer.
Mas mesmo que ela seja um gênio, continuará sendo uma pessoa antipática, que escreve mais pelo status de “escritora” e menos pelo amor à arte literária. Seu jeito estou tão acima que não estou nem aí, esconde uma profunda falta do que dizer. Seu descaso pelos clássicos – até os gregos e romanos foram desprezados pela autora – denunciam que Clarah não conhece a própria trajetória do universo ao qual pretende fazer parte. Se quer romper, não sabe do que está se distanciando; se mantém algum traço de seus antecessores, ignora (e a ignorância é o caminho mais curto para nos sentirmos vanguardistas).
Talvez um pouco mais de empenho na faculdade a ajudasse a saber pelo menos qual é a importância dos clássicos – até para que sua “inovação” fosse consciente – a distinguir fonte de influência, conhecer o conceito de Cânon, aprender que é justamente a crítica que dá lastro – mesmo que reprovando – às obras literárias; talvez na faculdade, Clarah descobriria que há mais escritores contemporâneos do que a meia dúzia que ela conhece. Maior empenho acadêmico serviria também para nossa amiga aprender que os clichês quase nunca produzem o efeito estilístico desejado pelo autor que os usa inconscientemente, e que os bons escritores, ainda que pertençam a movimentos artísticos bem definidos, sabem criticar e brincar com os “dogmas literários”. Ou nossa heroína – sem trocadilhos, por favor - estudou em uma faculdade muito ruim ou era uma péssima aluna, que nunca chegou a entender bem o porquê de um curso superior. Mas quanto charme ela dispensa em desprezar a universidade!
Mas posso estar enganado. Erro ao julgar a obra de Clara Averbuck apenas por uma mera entrevista – já disse isso antes? Pode ser que ela tenha um talento tão nato, tão instintivo, tão pautado na inspiração e tão inovador, que ainda não saibamos lidar com a sua obra genial. Pode ser que a exemplo de Rimbaud, Augusto do Anjos, Gregório de Matos e Walt Witman, seu reconhecimento só venha anos depois de sua morte (que pena). Se até Drummond foi ridicularizado por alguns críticos quando lançou o hoje fundamental Alguma Poesia, por que não levar em conta a hipótese de Clarah ser uma escritora incompreendida e/ou injustiçada? Pode ser. Mas até que o seu reconhecimento chegue, caso a nossa amiga esteja viva, é muito bom aprender a se expressar sem parecer um dicionário de citações e expressões pop. Ou então, seguir os exemplos de Dalton Trevisan e Rubem Fonseca e parar de dar entrevistas – isso se controlar sua vaidade. Dalton sabiamente escreveu que o conto sempre é mais interessante do que o contista; Rubem atesta ironicamente em um conto que escritor adora dar entrevista. Ambos falam pouco, mas escrevem muito – e muito bem.

PS: Com medo de escrever algo realmente muito injusto sobre Clarah, dei uma pesquisada em seus textos publicados na internet. Após apurada leitura, decidi não mudar uma vírgula sequer do que aqui vai escrito
PS2: Ainda com medo de ser considerado um franco-atirador, li o conto de Clarah inserido na coletânea organizada por Luiz Ruffato e prossigo com as mesmas opiniões acima.
PS3: Os animais são nossos amigos.

Nenhum comentário:

Seguidores

Arquivo do blog