quarta-feira, junho 18, 2014

Adiós, muchachos!


Dia desses, a respeito do craque santista Giovanni, que jogou no Barcelona nos anos 90, escrevi que técnica sem poesia, é coisa de "operários, maquinistas". A seleção da Espanha dos últimos seis anos foi um time inquestionável; com jogadores habilidosos do calibre de Xavi, Iniesta… e quem mais, mesmo?
O time da Espanha, assim como o do Barcelona, não deixando de lado que o clube pode contar com uma série de jogadores estrangeiros, como Neymar e um tal de Messi, era composto de muitos operários e maquinistas, empenhados, competentes, mas incapazes de fazer algo fora do manual.
Muita gente achou que faltou humildade e sobrou arrogância ao elenco e ao técnico. Pode ser verdade, mas outra coisa muito importante se passou com essa equipe que fez história. Eles acreditam tão apaixonadamente no estilo de jogo que os consagrou, que são simplesmente incapazes de fazer algo diferente quando algo dá errado. A crença quase religiosa no esquema tático consagrado, o tal "tik, taka", foi a razão da glória e do ocaso da Espanha. A derrota de hoje não apaga os méritos das conquistas recentes. Mas será que ficará algum legado?
A geração vitoriosa da Espanha conta com jogadores excepcionais, mas, que me perdoem os especialistas do assunto, não tem um craque. Não tem um cara capaz de fugir do roteiro, de improvisar, de surpreender. No jogo que talvez tenha decretado o fim de uma era, contra o Chile, os espanhóis perdiam chances claras de concluir porque exageravam na troca de passes, até perderem o melhor momento para o arremate, até serem desarmados. Quando tentavam agir de modo mais agudo, enfático, davam chutões da defesa para o ataque, cruzamentos afoitos, uma coisa pavorosa.
O alto nível técnico da Espanha, que encantou ou matou de tédio o mundo, foi eficiente enquanto não foi entendido e absorvido pelos adversários. Encaixotados, marcados sob pressão, a técnica sozinha, que já venceu um Mundial e duas Eurocopas, submergiu. Até que demorou muito.
O Barcelona, o Real Madrid e times medianos e até da segunda divisão espanhola, podem contratar craques. Os clubes espanhóis não formam craques, e a seleção, no máximo, conta com alguns jogadores competentes que se naturalizam por razões profissionais. Não dá tão certo assim, ou porque os expatriados nem são tão competentes assim, ou porque não conseguem se envolver sanguineamente com a seleção de um país que não é o seu. Empatia também pode fazer muita diferença.
O Brasil é desses países que, de vez em quando, vê surgir um craque. Quando consegue associar o treino, a técnica e a arte, quando combina operários, maquinistas e gênios, fica perto da perfeição. Em 2010, Dunga preferiu levar maquinistas, gladiadores, mas desprezou os craques e passou vergonha. Em 2014, a escassez de craques, a má fase de muitos jogadores especiais, levou a uma convocação quase unânime (portanto, perto da burrice), previsível e manjada. Sem buscar algo novo, surpresas, irreverência, temos tudo pra ficar no caminho, assim como já ficou a seleção espanhola.
Deixando saudades ou não, esta geração de competentes jogadores espanhóis se despede. Merecem respeito, entraram pra história, mas deixaram o caminho livre para as seleções que pretendem construir o presente. Vamos aguardar.


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