quinta-feira, novembro 11, 2010

Beijos & Versos

Ana Maria Machado afirma no prefácio do livro Comédias Para se Ler na Escola, de Luis Fernando Veríssimo, que é tão absurdo dizer “eu não gosto de ler” quanto afirmar “eu não gosto de comer”. Assim como não gostamos de tudo que nos oferecem à mesa – Couve? Repolho refogado? Quiabo? Coco? Argh! – também não podemos dizer que não apreciamos absolutamente nada que seja escrito.
Sim, a variedade de opções de leitura é tão grande quanto os gostos de cada indivíduo e, imagino, muito maior do que as opções gastronômicas disponíveis.
Mas, além da multiplicidade de opções de que podemos dispor quando o assunto é leitura, a afinidade entre o texto e quem lê também é fundamental, e pode ser tão íntima quanto um beijo pode ser.
Ler é como beijar! O leitor de lábios calejados, experimentados, bem sabe que um beijo não depende só de uma pessoa: é um ato conjunto, em que damos e recebemos algo ao mesmo tempo. Algo bom, esperamos, mas que muitas vezes, independentemente da habilidade dos parceiros, a coisa desanda. Por mais exímio beijador que você seja, se o(a) parceiro(a) de bitocas não têm uma pegada significativa, a coisa pode babar. E muito!
Assim como o beijo, a relação entre leitor e texto – e não entre leitor e autor, vale frisar – é única, pessoal e intransferível. Ambos, quem lê e o que é lido, precisam alcançar a mesma sintonia. E não, o fato do texto não agradar a um leitor, não quer dizer nem que o texto seja ruim, muito menos que o leitor seja burro. Significa que, naquele momento, os dois não estavam na mesma “vibe” – e nada impede que, num futuro, próximo ou longínquo, os dois não possam tentar de novo e, aí sim, se completarem. Da mesma forma, o texto que se apresenta exuberante hoje, no futuro pode parecer imaturo, extravagante, pedante e perder o encanto, enquanto o leitor pode ficar mais insensível, exigente, relapso, conservador, chato...
O importante mesmo, para beijos e leituras, é continuar praticando, experimentando. Contudo, creio, a promiscuidade com os textos é bem mais saudável do que a promiscuidade dos beijos. Pelo menos é muito mais “seguro” e nos leva a experiências bem mais diversas do que um beijo – por mais saboroso que ele seja.

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