terça-feira, novembro 23, 2010

Ao pastor que não me ouve

Aqui vai mais um texto de uma ovelha mansa.
Dessa vez, quero escrever algumas sugestões – as pessoas cada vez menos gostam e acreditam me conselhos, veem neles, uma inveja recalcada, uma tesoura pronta a podar nossos sonhos e atitudes, acreditam que os conselhos são o bafo de satanás em nossos ouvidos. Penso que, como o senhor sequer me lê, o exercício será vão. Mas eu não tenho coisa mais interessante a fazer – há um mundo por ser consertado, há pessoas precisando de amor, há famintos, corações dilacerados, mas, buscando seguir os seus passos, fico aqui pensando, pensando, pensando, sem compromisso algum com a prática. Vamos ás sugestões:
O senhor já é homem maduro. Criou todos os filhos, todos prontos para encarar o mundo. Sua mão protetora, o sustento que partiu do suor do seu rosto – justíssimo salário, não questiono isso! – permitiram que sua família pudesse se manter e que todos agora possam caminhar com seus próprios passos. Há pouca coisa para planejar, do ponto de vista financeiro, para o futuro. O senhor tem casa, carro e algum dinheiro no banco. Seu salário continua gordo. Suas estantes estão cheias, há sempre um amigo querendo presenteá-lo com um CD, um livro, há viagens de negócios que podem facilmente fornecer alguns momentos de ócio. Quão nobre seria de sua parte abrir mão de parte de seu salário para o Reino de Deus! Não entenda que o Reino de Deus é algo que separa alma e espírito. As pessoas precisam conhecer o evangelho e precisam comer! Participar de vigílias e de estudar! Os cultos precisam de instrumentos musicais que funcionem e os que cultuam precisam de roupa limpa, nova! O livro novo, a viagem dos sonhos – caríssima – o sapato elegante – importado – não podem ser deixado de lado em nome de uma causa nobre, justa, que envolva realmente ação? Precisam...
Quer outra sugestão? Fuja das mesas fartas. Fuja dos tapinhas nas costas. Fuja dos olhares que brilham ao verem o senhor como se vissem o Pe Lu da banda Restart! Tudo bem, como se vissem o Chico Buarque fazendo suas caminhadas pelo Leblon ou pela floresta da Tijuca. São olhares de admiração, logicamente, mas alguns escondem idolatrias cultivadas a ponto dessas pessoas passarem a defendê-lo mesmo que o senhor se torne o mais novo entusiasta do neonazismo. Estas pessoas, que lhe cobrirão de carinho – e sempre é bom ser amado, quem duvidará disso? – são incapazes de repreendê-las. Já nas mesas fartas os problemas reais do mundo, viram apenas teses, especulações, material para retórica. Nas mesas fartas, nos lugares de honra, a verdade não se esconde, nem aparece. Ela é escamoteada. Freqüentar estes lugares nos deixa, pouco a pouco, arrogantes, donos da verdade – e bater nos donos da verdade, com o tempo, torna-se apenas mais um exercício de arrogância, não de compaixão. A gente decreta máximas, despreza pessoas que não participam da mesma ceia que nós, e fica pensando que está defendo o que é certo e combatendo o que é errado. As mesas fartas e os tapinhas nas costas, além dos olhares brilhantes de admiração cega e fecham a porta para verdade. Ficamos trancados em salas cheias da nossa verdade, que muitas vezes não passa da afirmação d que tudo é verdadeiro, ou que nada pode ser digno de ser chamado de verdade – mentirinhas nietzscheanas que estão na moda.
Finalmente, sugiro ao senhor que volte a ler Sócrates (Platão, leia Platãom as ouça Sócrates). Ele era bem arrogantezinho, mas tinha um talento imenso para estabelecer o diálogo, do qual não fugia nunca, principalmente com as pessoas de quem discordava. A riqueza intelectual mora na discordância produtiva.
O senhor bem deve ter percebido como sou um autêntico discípulo seu. Escrevi máximas, algumas bem legais, outras de gosto duvidoso, como convém a quem não é genial. Mas por ora ainda me falta crer na própria genialidade – nestedia, fundarei a minha própria igreja!

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