quarta-feira, novembro 09, 2011

Quando a USP me envergonha

O sentimento que dispara em mim a cada nova informação que tenho sobre os desdobramentos da ocupação da reitoria na USP é sempre o mesmo: vergonha.
A vergonha de precisarmos lidar com um reitor como o que está aí. A vergonha de saber que os estudantes que foram detidos ontem na reintegração de posse da reitoria foram indiciados, entre outros motivos, por crime ambiental, enquanto a reitoria teve autorização para desmatar uma parte significativa da Cidade Universitária. Independente da questão legal, esse paradoxo indica uma hipocrisia legalizada.
Vergonha por saber que as assembleias de estudantes são conduzidas de modo aparelhado, sem que os estudantes não alinhados ideologicamente com a mesa possam realmente se manifestar. Já presenciei, em outros carnavais, pessoas sendo claramente hostilizadas por discordarem do que a mesa queria impor. Argumentos como “sai daqui, você é rica”, foram alternados com alguns palavrões. Também já soube de votações que foram sucessivamente refeitas até que a vontade da mesa prevalecesse.
Também dá vergonha saber que a maioria dos estudantes não participa das assembleias, não por medo de repressão, mas simplesmente porque não querem se envolver com nada além de sua formação pessoal, para depois sair correndo da universidade, conseguir um emprego bom e pronto. Para eles, a palavra universidade não significa nada além de “algo ao redor do meu umbigo”.
Vergonha por deduzir – e a dedução pode ser um enorme equívoco – diante de algumas pichações deixadas ao redor da reitoria, que havia aluno achando que aquela invasão da reitoria era algo comparável ao que Fidel Castro e seus combatentes fizeram em Havana. Eles pensavam que estavam não ocupando, mas “tomando” a reitoria, de acordo com as frases que diziam que a reitoria estava voltando para as mãos de seus verdadeiros donos. É o tipo da ingenuidade que cai nas graças dos líderes mais maliciosos, ávidos por encontrar a massa de manobra ideal.
Vergonha por acompanhar pela mídia que as decisões tomadas pelos estudantes serviram de estopim para que toda a universidade fosse ridicularizada e odiada pela opinião pública. A falta de criatividade e de sensibilidade, a perspectiva pela qual agiram, deixou a sensação de que esses alunos engajados não agiram de modo muito distinto dos indiferentes, vendo a Cidade Universitária como seu universo particular.
Vergonha por saber que é necessário que haja mais segurança para toda a comunidade da Cidade Universitária, para alunos, funcionários, professores, para os moradores da região, para os que frequentam seus museus, andam de bicicleta, correm, caminham, praticam remo, para os pacientes do Hospital Universitário. É preciso segurança para que não haja mais assaltos, estupros e assassinatos. Enquanto isso, a polícia presente na Cidade Universitária prefere caçar ponta de baseado em mochila de estudante. Outra atividade da polícia no campus tem sido inibir a organização estudantil e sindical. Em vez de proteger – os locais ermos da universidade continuam sem policiamento – impõem insegurança e medo, e não apenas para os usuários de drogas ilícitas.
Vergonha porque encontraram coquetel molotov na reitoria.
Vergonha porque muita gente quis reduzir a discussão acusando os estudantes de usarem roupas de grife.
Vergonha porque ninguém questionou o fato de o atual reitor não per sido eleito, mas nomeado pelo então governador José Serra, de acordo com uma lei forjada nos tempo da ditadura. O reitor não foi a escolha da maioria.
Vergonha porque muita gente fora da universidade pensa que lá é “lugar de estudar”, entendendo com estudar passar nas provas, pegar o diploma e não “criar” caso, ou seja, questionar, sendo que questionar é obrigação dos estudantes, e que o único lugar onde os erros podem ser produtivos é nos ambientes de educação.
Vergonha e falta de rumo. É isso.

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