terça-feira, abril 28, 2009

antessala

um passo antes
de qualquer paixão
um balde cheio de medo
um cisco gelado de insegurança
a cratera incerta de um tenso desejo
contradançam
no piso movediço
da pele em flor

segunda-feira, abril 27, 2009

Não foi o Corinthians, foi o Ronaldo

Sou santista.
Começar um texto assim hoje cria expectativas, por conta do jogo de ontem. Esperarão rancor, reclamações, despeito e toda ira que um santista poderá despejar por conta de uma derrota, em casa, com um placar que não pode deixar dúvidas quanto ao mérito do adversário que é justamente o Corinthians, sendo que, tirando o “detalhe” do gol, o Peixe foi muito superior.
Acontece que no futebol, ao contrário o que pensam alguns "especialistas", o gol não é detalhe, e o Corinthians conta com um dos maiores especialistas de fato nessa área. Já devíamos desconfiar disso, pois, mesmo quando estava afastado dos gramados, ainda em recuperação, soubemos que Ronaldo não deixava de treinar com duas, quatro, ou mesmo seis bolas ao mesmo tempo – para aguçar seu domínio – e deixava claro que, para ele, tanto fazia jogar enfiado ou ser o homem que vem de trás, exatamente como ele vem fazendo nos jogos.
Desde que voltou a jogar, Ronaldo teve que superar uma série de desconfianças sobre suas condições. Era golpe de marketing? Sim, não deixava de ser. Ele não estava em plenas condições de jogar futebol profissionalmente? Não, não estava. Sua cabeça estava mais nas baladas e na curtição do que na carreira? Não há dúvidas. Mas aí, pouco a pouco, o cara resolveu jogar, foi fazendo gols, retomando o gosto pela coisa – tudo bem, os jogadores que enfrentou por aqui são, em sua maioria, cabeças de bagre – e aí ele veio, gol a gol calando a boca dos desconfiados.
Seu primeiro gol na “volta”, contra o Palmeiras, foi supervalorizado. Jogada chinfrim, um simples gol de cabeça em que a defesa adversária ficou plantada apenas assistindo, teve repercussão mundial e babação de ovo até de jornalistas sérios, uma grande manipulação e tal. Ronaldo ainda não havia conquistado alguns céticos.
Até que, no jogo de ontem, o cara domina a bola com maestria no segundo gol do Corinthians e arremata com eficiência e, pra completar, marca um golaço, coisa que só craque consegue fazer. Ontem, por causa de Ronaldo, o Corinthians teve duas chances claras de gol e marcou três vezes! Sim, pois o terceiro gol não seria uma chance clara de gol, foi algo tirado da cartola!
A última boca que Ronaldo ainda não havia calado, a minha, fechou-se ontem, com amargura, mas também com reconhecimento.
Não abro mão do meu papel de torcedor, que é essencialmente torcer, mas, precisando marcar três gols sem sofrer nenhum, jogando contra um time que vai explorar os contra-ataques e que tem Ronaldo na frente, devo dizer que dessa vez, Peixe, com todo respeito ao Madson, já era.. mas, perder pro Ronaldo (esqueçam o Corinthians), ainda mais jogando como o Santos tem jogado, não é nenhuma vergonha, não: é apenas a ordem natural das coisas.

sexta-feira, abril 24, 2009

Lista, poluição e o inominável!

Quando falta assunto, é comum entre os cronistas jogar listas de sinônimos na página. Elas dão um ar engraçado, reforçam imagens, “engrossam” o texto. Por exemplo: crônica com “cachaça”, certamente terá pinga, mé, água que passarinho não bebe, aquela que matou o guarda, aguardente, cana, purinha; porre garantido! Alguns desses termos só existem mesmo é no meio das crônicas, o que denuncia sua artificialidade. Outro artifício é falar sobre o tempo: o calor causticante, o tsunami, a floresta incendiada, as geleiras derretidas.
Essas listas não são exclusividade dos cronistas, que precisas escrever toda semana. As conjunções adversativas adoram andar em família: mas, porém, contudo, entretanto, todavia. Talvez, quiçá, quem sabe, as adversativas formem a lista preferida de professores e contadores de casos a cada dia mais reais, como furacões, tempestades e terremotos.
Na maioria das vezes, as listas servem é pra esconder nossa preguiça e desperdiçar o valioso papel. Machado de Assis ensinou que a crônica nasce do banal: alguém reclama do tempo e já temos a desculpa necessária para uma boa conversa – e toda crônica não passa de uma boa conversa. Com o calor que vem fazendo, vivemos a era das crônicas!
Entre os grandes escritores, as listas também aparecem, mas com estilo, não para apenas preencher espaço. Guimarães Rosa, por exemplo, arrolou vários sinônimos nomes para o diabo. Eita cabra pra ter apelido, esse tinhoso! São incontáveis, e existem justamente para que não o chamemos pelo nome. Recusar a (des)graça do cão resulta no oposto, pois em vez de evitá-lo, lhe damos destaque exagerado, para que todos saibam de quem não estamos falando: não o queremos por perto e não paramos de citá-lo!
Ele é o diabo, satanás, o cão, tinhoso, pai da mentira, rompe-mato, o barriga-dura, astarote, baal, rei de Tiro, leviatã, gramunhão, cabrunco, demóstenes, pé-de-cabra, bode-preto, chifrudo, zé-pelintra, dragão, grande prostituta, couro-de-sapo, reza-curta, comunista, santantão, rasculeno, tripa-torta, repelente, indigitado, indizível, cabeça-de-área, anticristo, zero-zero, capeta, esbugalho, encruzilhado, é o caboclo sete-folha-verde, ossanhoxossuê, regra-frouxa, príncipe deste século, maligno, cavalo-em-casco, chá-de-pão, nem-me-diga, chega-e-vira (isso é nome de passarinho!; passarinho pega bem em crônica!), a serpente, o valente, cartola (não o músico!), coxinha, bruaca, rebordosa, patrão, relógio-de-ponto, série B, sogra, ré-no-quibe, baba-canivete, música-de-trabalho, babilônia, meia-meia-meia, adversário, inimigo das nossas almas, anjo caído, inominável, é o lúcifer.
Se a lista resulta inútil – não a de Guimarães Rosa: a minha – ao menos preenche o espaço da coluna. Estou virando cronista profissional!
Mudando de assunto (ainda temos espaço): e o aquecimento global, hein?
Deveria ser sabido de todos que o aquecimento global não é assunto exclusivo de ativistas ambientais: sem vida, não há ideologia possível. Não é frescura de jovem rico procurando algo para se rebelar, nem golpe de grande laboratório querendo vender algum creme milagroso contra raio ultra-violeta; também não é lenda urbana ou mero tema para filme americano: caminhamos para o fim do mundo, o apocalipse, a consumação dos séculos, o armagedon, o the end...
Bom reflexo de nossa maneira narcisista de viver, interessada no aqui e no agora, nosso descaso com a natureza gera uma justa resposta: a terra treme, o vulcão vomita, o furacão engole casas, o sol racha solo e cucas, a neve soterra carros e plantações, o mar devora cidades, pescadores e turistas. Mesmo assim, mantemos nossos hábitos “civilizados”: jorramos dióxido de carbono pelos ares, mutamos alimentos em venenos cancerígenos, arrancamos árvores descontroladamente, promovemos queimadas, endurecemos pulmões (nossos e alheios) com nicotina, estouramos tímpanos com barulho excessivo, espalhamos cartazes, placas e faixas sem o menor critério, soltamos balões, “genocidamos” sem clemência ou motivo. A exemplo do que fazem com o diabo, evitamos o problema enquanto nos afundamos nele: bitucas de cigarro, latas de alumínio, garrafas, embalagens plásticas, tudo pelas ruas, entupindo bueiros, emporcalhando rios, chamando enchentes; desperdício de água, de eletricidade – mil aparelhos ligados ao mesmo tempo – buzinas gritando, simpatia negada, solidariedade economizada, papel desperdiçado; nada disso, fingimos, interfere na saúde precária do planeta: canastrões, interpretamos o papel de vítima do sistema.
E ri-se satanás, o racha-cuca, o água-poluída, o efeito-estufa, o não-reciclado, o desmatamento, enquanto o sol desaba sobre nossas cabeças, sobre nosso futuro...
Contudo, existe uma lista de três palavrinhas, não de sinônimos, que contém os elementos necessários para reverter nossa história: fé, amor e esperança.
Tem feito calor ultimamente, não?

terça-feira, abril 07, 2009

Mudança de rumo?

Informo a todos que estou em estado poético. A prosa, onde caminho com mais facilidade, tem fugido de mim. Gavetas cheias, arquivos abarrotados, tudo entupido de coisas pela metade, inacabadas, quase nem iniciadas. Os versos, as epifanias, coisas diáfanas, palavras estranhas, frases curtas, lirismo doente, me rodeiam, enforcam e trazem à tona após jogar alguma coisa no papel (falar em “papel” já é linguagem figurada o arcaísmo). Não sou poeta, mas estou empoetado!
Vê aí embaixo:

segunda-feira, abril 06, 2009

difusa luz no cinza-chumbo
encobre o que não sorri
me escondo no seu escuro
não sei me fingir feliz

Seguidores